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FAO oficializa reconhecimento internacional do Sistema Tradicional e Agroecológico de Erva-mate

  • jainevergopolem
  • 4 de nov.
  • 4 min de leitura

Atualizado: 6 de nov.

Brasil recebe certificado SIPAM/GIAHS em Roma; agricultoras e agricultores celebram conquista histórica ao lado de organizações da sociedade civil e instituições públicas


por Jaine M. Vergopolem W.


O sistema tradicional e agroecológico de erva-mate cultivada à sombra da Floresta com Araucária, no Paraná, passou a integrar oficialmente a lista dos Sistemas Importantes do Patrimônio Agrícola Mundial (SIPAM/GIAHS). A certificação, concedida pela Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), em 31 de outubro de 2025, durante cerimônia realizada na sede da entidade, em Roma, que integrou a programação comemorativa dos 80 anos da instituição.


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O evento destacou a inclusão de 28 novos sítios agrícolas em 14 países ao programa nos últimos dois anos. Eles representam territórios rurais de grande relevância na preservação da biodiversidade, na valorização de conhecimentos tradicionais e na resiliência diante das mudanças climáticas.


“Meus parabéns especiais vão para os agricultores, pescadores, pastores e silvicultores que mantêm esse conhecimento tradicional vivo, em um momento em que ele é mais relevante do que nunca,” declarou o Diretor-Geral da FAO, Qu Dongyu, em mensagem enviada aos participantes.


Segundo sistema brasileiro incluído no GIAHS


O território da “Erva-mate sombreada: um sistema agroflorestal tradicional na Floresta com Araucária, Paraná, Brasil torna-se o segundo sítio brasileiro reconhecido pelo programa. O primeiro foi o das Apanhadoras de Flores Sempre-Vivas, em Minas Gerais. Ambos representam soluções integradas de produção agrícola que conciliam conservação ambiental, geração de renda e salvaguarda de modos de vida tradicionais.


Para Maristella Matos, secretária substituta de Governança Fundiária, Desenvolvimento Territorial e Socioambiental, o reconhecimento é “um grande passo no uso da terra de forma justa, produtiva e sustentável. E  nós queremos continuar avançando por ainda mais reconhecimentos, dada a riqueza ambiental e cultural do nosso país”, explanou ela em fala no evento.


Honra, memória e continuidade


Entre os representantes brasileiros na cerimônia estava Jessica Mara Vergopolem, erveira, agricultora familiar ecologista, integrante da ECOARAUCÁRIA e representante da Fetraf-Paraná e do Observatório da Erva-mate. Em suas palavras, o momento foi de celebração coletiva: "Fazer parte deste evento fez meu coração florir, assim como a Caá-Yari — a nossa querida erva-mate. Representar minha família e todas as erveiras e erveiros foi uma honra. Receber este reconhecimento só fortalece o trabalho que fazemos dentro do Sistema Tradicional e Agroecológico da Erva-mate. E eu, como mulher, que carrego o amor pela terra e pela erva-mate, desejo transmitir esse trabalho para o mundo, para que alcance força e se expanda cada vez mais em forma de políticas públicas", explana.


O diretor-presidente da ECOARAUCÁRIA, Bernardo Vergopolem, reforçou o compromisso coletivo diante da nova etapa: “É agora que o trabalho começa! O reconhecimento nos dá a missão de proteger e difundir cada vez mais este sistema, junto com as nossas ações e lutas que também aumentam”, enfatiza ele.


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O sistema é mantido por famílias agricultoras do Sul do Paraná que, ao longo de gerações, desenvolveram um modo de cultivo da erva-mate em harmonia com a Floresta com Araucária, preservando biodiversidade, cultura e modos de vida. Para o analista ambiental do ICMBio, Anésio da Cunha Marques, a certificação simboliza resistência e “é uma grande conquista para os agricultores e agricultoras do Sul do Paraná, que, mesmo sem políticas públicas estruturadas, mantêm viva essa tradição agroecológica e repleta de significados”, explica.


Tradição viva, floresta viva


Durante a Session III: Talk Show, realizada no âmbito da cerimônia, a coordenadora do SIPAM brasileiro, Eve Nimmo, destacou os fundamentos ecológicos que sustentam o reconhecimento:


“A erva-mate sombreada se desenvolve em um modelo de produção que respeita a floresta, um ecossistema hoje extremamente ameaçado. Ainda assim, mesmo sem financiamento dedicado — sustentado apenas por trabalho voluntário — o sistema segue vivo, conservando a biodiversidade e contribuindo para regenerar a mata.”


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Nimmo frisou que a continuidade do sistema depende da transmissão de conhecimentos tradicionais: “A relação das famílias com a natureza é antes de tudo emocional. Ela se expressa na tradição alimentar, na roda de chimarrão compartilhada todos os dias. Essa ‘fábrica social’ criou uma comunidade forte, que hoje sustenta o SIPAM — são cerca de 400 famílias distribuídas em 11 municípios.”


A sessão reuniu guardiões de sistemas GIAHS do Brasil, Equador, Tunísia, República da Coreia e Itália, além do presidente do Scientific Advisory Group, em um intercâmbio sobre cultura, biodiversidade, resiliência e os desafios de manter vivos modos de vida ancestrais.


Fortalecendo a tradição


O reconhecimento internacional fortalece a luta de comunidades que há gerações mantêm práticas agrícolas integradas à floresta, combinando tecnologia social, espiritualidade, cultura e sustentabilidade. Ele também abre portas para a construção de políticas públicas, iniciativas de pesquisa, fortalecimento de mercados e ampliação da visibilidade global da erva-mate sombreada.


Neste ano, a celebração reuniu guardiões, instituições parceiras e comunidades para reconhecer seus territórios como patrimônios agrícolas vivos. O programa se desdobrou em três momentos principais — cada um destacando diferentes dimensões da salvaguarda dos sistemas agrícolas tradicionais. Veja os três momentos da cerimônia na íntegra: Session I — Award Ceremony; Session II — Policy Dialogue; e Session III — Talk Show.


Para quem guarda a mata, o saber e a tradição, esse é um novo capítulo — um marco que reafirma o papel das agricultoras e agricultores na conservação da biodiversidade e na construção de futuros sustentáveis. Agora, mais do que nunca, a erva-mate nascida à sombra da floresta, segue agora ecoando pelo mundo como símbolo de resistência, cuidado e inovação enraizada no território.


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Comitiva brasileira: 

  • Eve Nimmo, coordenadora do SIPAM-Erva-mate;

  • Jessica Mara Vergopolem, agricultora familiar ecologista, erveira e representante da ECOARAUCÁRIA, da Fetraf-PR e do Observatório da Erva-mate;

  • Ana Paula Wanglarek, erveira, representante dos faxinalenses e do CEDerva;

  • Alessandra Izabel de Carvalho, UEPG;

  • Maristella Matos, MDA;

  • Anêsio da Cunha Marques, ICMbio;

  • Nelson Dias da Silva, representante da Fetraf-PR e do Observatório da Erva-mate.



Fotos: ©FAO/Giuseppe Carotenuto | ©Observatório da Erva-mate-ECOARAUCÁRIA.

 
 
 

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